Por Luciana Morete
Quem nunca tentou cancelar algum serviço ou questionar uma cobrança indevida e foi submetido a verdadeira tortura psicológica, tendo que repetir a pretensão para vários atendentes? E quando você acha que está quase resolvendo e a ligação cai?
O consumidor confirma dados pessoais, aguarda a localização do cadastro no sistema, narra sua solicitação, tem que repetir devagar para o operador registrar, e, depois de muito tempo, é informado de que deverá falar com outro setor. Quando a ligação é transferida, tem que recomeçar do princípio, narrando novamente tudo o que falou antes.
Às vezes, a ligação é transferida mais de uma vez. Outras vezes parece que o funcionário da empresa prestadora do serviço não fala a mesma língua que você. Na maioria dos casos querem te convencer a não rescindir o contrato ou te provar que o valor é devido. É um verdadeiro calvário.
Muita gente acaba desistindo. Parcela significativa da população experimenta sentimentos negativos como angústia, raiva, indignação, impotência, arrependimento de ter contratado o serviço, descaso, revolta, dentre outros.
O advogado Marcos Dessaune desenvolveu a teoria denominada desvio produtivo do consumidor, que defende que o tempo desperdiçado na tentativa de solucionar problemas gerados por defeito na prestação de serviços configura ato ilícito do fornecedor, que causa dano moral, e deve ser indenizado.
A tese foi ganhando força na jurisprudência e atualmente é reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça.
O Ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do AREsp 1.260.458/SP, na 3ª Turma do STJ, em decisão monocrática, se pronunciou:
“Especialmente no Brasil é notório que incontáveis profissionais, empresas e o próprio Estado, em vez de atender ao cidadão consumidor em observância à sua missão, acabam fornecendo-lhe cotidianamente produtos e serviços defeituosos, ou exercendo práticas abusivas no mercado, contrariando a lei."
"Para evitar maiores prejuízos, o consumidor se vê então compelido a desperdiçar o seu valioso tempo e a desviar as suas custosas competências – de atividades como o trabalho, o estudo, o descanso, o lazer – para tentar resolver esses problemas de consumo, que o fornecedor tem o dever de não causar”
Com a consolidação da teoria do desvio produtivo do consumidor, fatos que antes eram considerados meros aborrecimentos passaram a configurar conduta ilícita dos maus fornecedores, dando ensejo à responsabilização civil, e à condenações por danos morais, a fim de indenizar os consumidores pelos prejuízos extrapatrimoniais experimentados e a punir os prestadores de serviço e/ou fornecedores de produtos em virtude do descumprimento de seus deveres legais e contratuais.
Luciana Valverde Morete é advogada, sócia da Mansur, Morete e Stanzani Advocacia.